quinta-feira, 10 de agosto de 2006

Mendigos no semáforo


Antigamente, não muito, mas há um tempo, tínhamos mendigos nos semáforos. Eles eram sujos, pediam esmola (nessa época ainda era esmola o sinônimo de pouco dinheiro). Eles exibiam dentes pretos, quando eles existiam. Exibiam roupas rasgadas e coisas do gênero. Eram pedintes ou trombadinhas.
Hoje, temos palcos, não mais cruzamentos. Temos mercados nos semáforos. São milhares de artistas (tão sujos quantos os mendigos) que jogam bolas, limões, tochas de fogo etc, etc, etc. São meninos que sequer estudam e que sequer fazem qualquer malabarismo, mas exibem-se em frente aos carros e aos motoristas. São baleiros, jornaleiros, macumbeiros e outros eiros que se aventuram entre os carros por moedas.
Mercantilizaram a pobreza. Ninguém mais é pedinte porque - julgam! - estão ali "ganhando o dinheiro honestamente". Ninguém mais é trombadinha porque não estão roubando. Ninguém mais é mendigo porque não exibem a pobreza como condição, mas como causa daquele trabalho que, embora humilde, é digno.
E eu me pergunto: quem são esses artistas de sinais? São mendigos disfarçados de malabaristas? Qual a honestidade daqueles subprodutos que são vendidos enquanto a luz vermelha se transforma em verde? Essas pessoas deixaram de ser o retrato da pobreza que se instalara em nossas avenidas mais movimentadas? Que dignidade essas pessoas pensam ter resgatado?
Antigamente cidadãos subiam os vidros ao verem mendigos no semáforo! Hoje sobem os vidros na cara dos palhaços. Mas que maldade...
Mustafá!

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