terça-feira, 29 de maio de 2007

Esqueceram de voar...


A minha vizinha e síndica, D. Mercedez* adotou um pássaro. Não posso dizer que ela tomou a iniciativa, uma vez que, segundo ela, ele é que se instalou, como diria Chico, "feito um posseiro" dentro de sua casa. Ele entrou pela janela, cuidou-se de alimentar da ração dos outros animais da casa, aninhou-se no lustre e defeca pela casa quando o convém. D. Mercedez, como boa anfitriã que é, tratou logo de cobrir espelhos, móveis - inclusive seu belo piano - e tudo quanto fosse lugar para que a ave ficasse bem acomodada. Deixou num canto uma gaiola, como a que vive seu outro pássaro. Só que essa está aberta e o novo morador da casa só entra quando tem vontade e fome. Dorme, vez ou outra, atrás do armário da sala.

É só ligar a TV para descobrir que tanto eu quanto a D. Mercedez estamos a mercê - sem trocadilhos! - do aquecimento global ou seja lá o que chama essa loucura que arrumamos com a natureza. Mas entender que passarinho - que podia voar e conhecer outros condomínios quando quisesse - quer ficar dentro de casa, morando às vezes em gaiola é, no mínimo, difícil. É contradição da natureza. Pássaro foi feito pro céu, não pra enxergar o mundo pelos vãos do aço da gaiola... Pássaro deveria querer mais que água e alpiste de graça...

D. Mercedez não se importa. Não sei mais definir quem é o dono da casa. Se é D. Mercedez e sua receptividade (com o pássaro) ou se é o pássaro com sua autoridade, impondo-se e mudando a rotina da senhora solteira. Não sei se é solidão de um ou de outro. Não sei se é pena. Se é falta de asa de um ou de outro... Sei que fico de fora, sem poder esperar o recibo do pagamento do condomínio com as portas abertas. Passarinho ali dentro anda solto, pode voar pela porta...

Será que a natureza vai perder também o sentido?

Mustafá!


* não sei bem se seu nome é Mercedez ou Mercês, por isso sempre quando me refiro a ela é rápida a minha pronuncia, para que ela não perceba o meu desconhecimento.

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